Desejos Nossos

Depois do Desejo é um projeto coletivo.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Os Seios de Minha Mãe

            O quarto onde minha mãe morava comigo acomodava, entre outros objetos, uma cama de casal, um fogão, um armário e um porta-retrato na parede com as fotos de meu avô e da minha avó. No berço onde eu ficava as imagens eram muito além da mera descrição do ambiente. Havia movimento, muito movimento. Desde a mais tenra idade eu vi homens entrar no quarto meu e da minha mãe. Senhores de diferentes idades, ávidos por raparigas que tivessem, como a minha mãe, beleza rara, semblante de anjo, garbo de estrela. Eles brincavam com ela, eu brincava com o maracá. Mas eles também costumavam, após o gozo, como quem bate o sino da vitória, aproximar-se do berço onde eu estava e também mexer no meu maracá. 
               Ainda distante eu ouvia pés nos degraus da escada andando ao encontro do quarto de primeiro andar onde ficávamos eu e minha mãe. Um homem se aproximou da porta pelo lado de fora, bateu levemente e aguardou. Era Alfredo, um senhor de traços finos, de roupas elegantes, com uma expressão de quem tem problemas emocionais muito sérios e que era em minha mãe onde encontrava refúgio para suas mágoas. Alfredo demonstrava grande expectativa diante da aproximação da mulher por quem era apaixonado. 
               Alfredo quis beijar minha mãe, mas ela disfarçou pegando na mão dele e o conduzindo para dentro do quarto. Alguns passos e ele soltou a mão dela seguindo em direção ao berço. Olhou para mim, fez uma gracinha e logo caminhou para os braços da minha mãe. Ela pôs uma música na radiola e os dois começaram a dançar. Alfredo acariciou as sobrancelhas, as faces, os lábios de minha mãe, já nem se importando com a minha presença. Instantes depois, com volúpia, desabotoou o vestido que despregou-se do corpo denunciando que minha mãe estava sem calcinha. Tinha no corpo apenas um sutiã vermelho. Eu vi toda a cena. O homem tomou minha mãe nos braços e jogou-a na cama.  Em meio às carícias, ela parecia ter consciência da minha presença e por isso, de vez em quando, ficava acanhada. Notei quando puxou o lençol encobrindo parte do seu corpo. Alfredo não se conteve e tentou soltar o sutiã vermelho. Havia um conflito, o movimento deixou-me inquieto. O homem foi mais bruto e conseguiu arriar o sutiã. Tentou beijar os seios de minha mãe, mas a firmeza das palavras afastaram o intruso. 
               - Não. Os seios não. 
               Impossível esquecer aquela cena. Minha mãe disse àquele homem que os seios dela eram meus. Entregou a ele todo seu corpo, menos os seios. Eram meus. Os seios da minha mãe eram só meus. 
               Muitos outros homens de sorrisos desconfiados e cheiro de cachaça entraram no quarto meu e da minha mãe, mesmo quando eu já sabia andar. E eu permanecia no berço, fingindo que nada escutava. Mas escutava. Fernando, um senhor de 40 anos, sorriso desconfiado, traços rudes, avançou sobre ela com a sofreguidão de quem desfruta das intimidades de uma princesa. Mário, um boêmio com cheiro de cachaça e semblante de poeta, entrou no quarto com uma garrafa na mão. Sorriu como um bêbado, transou como um bêbado, amou como um boêmio. Antunes, um senhor de aproximadamente 60 anos, com terno e gravata, deu-lhe uma bíblia de presente antes de levá-la nos braços até a cama. Lembro quando um desses homens perguntou à minha mãe se havia outros. Meu coração estremeceu e tive vontade de chorar quando ela disse que não. Não porque tivesse outros homens, verdade que eu já assimilava, mas porque ouvi minha mãe mentir. Havia conhecido o rapaz em um parque da cidade e este ficara encantado com o jeito dela. Mostrava-se galante e apaixonado. O rapaz que atendia pelo nome de Crispin, 17 anos apenas, transou com minha mãe. E depois, crente de que fosse o primeiro, sorriu satisfeito. O rapaz tinha a voracidade de quem oferta sua virgindade à primeira mulher de sua vida. Beijou minha mãe, alisou suas coxas, apalpou suas nádegas, tocou a língua em seu umbigo, arriou o sutiã e ameaçou tomar posse dos seios dela. Ouviu um não. 
               Ela fez amor com Crispin uma, duas, três vezes, mas preservou o que me cabia.
               - Eram meus. Minha mãe disse àquele homem que os seios dela eram só meus. Entregou a ele todo seu corpo, menos os seios. Eram meus, os seios de minha mãe eram só meus.
               Hoje já não sei por onde anda minha mãe. Voltei ao quarto que eu pensei fosse meu e dela, mas o lugar não existe mais. Fugi quando tinha 15 anos de idade e agora não sei por onde anda minha mãe. Ela também não sabe que, como ela, muitos homens freqüentam um quarto que tem um retrato seu na parede. A foto de minha mãe me policia, não nego, mas não posso tirá-la da parede... Minha mãe não sabe da foto, e nem sabe que os homens também não tocam em meus seios. Entrego a eles todo o meu corpo, menos os seios. Como os de minha mãe, os meus seios são só meus. Boêmios, poetas, cachaceiros, travestis, homens raparigueiros, todos avistam a foto da minha mãe, mas é a mim que procuram. Entrego a eles todo o meu corpo, menos os seios. São meus, meus seios são só meus. 

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